terça-feira, 22 de janeiro de 2008

Pra que discutir com madame?


O início.

Em março de 2007, eles eram os 17
escolhidos de um grupo de 60 candidatos.
Resistiram a invasão de fevereiro e a mais
demorada e dramática, a de maio, ainda
os aguardava...
Os ensaios começaram e as exigências também.
Era preciso dedicação, persistência e,

especialmente, coragem.
Coragem para propor na criação,
coragem para vencer pudores, medos e carências.

O diretor.

Um homem intenso é chamado para o
comando do grupo e propõe um processo
interativo, moderno e corajoso. Fabiano,
o Dadado, nosso fiel capitao.

Eles embarcam...O homem embarca...

A nossa carioca holandesa, Patrícia.

Uma mulher nos visita em uma aula e
a identificação é imediata.
Seus conselhos e idéias se tornam de grande
importância para o processo.

E ela também embarca...

As afinidades se estabelecem e as
verdadeiras amizades se encontram.
Vejo, aos poucos, a liberdade surgir
como tem mesmo que ser entre amigos
e companheiros de criação.

Aos poucos se forma um ninho e eu me
deito e eles se deitam...
Uma confiança mútua toma corpo e se

solidifica entre nós.
Nos tornamos a síntese da liberdade.
Podemos falar o que quiser um com o outro,

podemos até nos amar.

De quantas pessoas vivas você sente saudades sinceras?



As sucessivas invasões e conflitos tornam
tudo difícil e revoltante. Armamos esquemas
de comunicação e cuidados uns com os outros.
Apoio afetivo e de manutenção da vontade.
Persistência, mesmo na falta da água e da luz,
cortada pela polícia, mesmo sem os telefones...
Mesmo com os tiros desleais de fuzis e metralhadoras giratórias.
Mesmo com a insegurança, o preconceito

e a incerteza de valer a pena tanto esforço e risco...
Mesmo e apesar de tudo, a gente dança sob o som dos canhões.

(Estamos brigando contra quem mesmo?)


O trabalho é incessante. O piso não é apropriado...
Os corpos padecem, a alma se eleva. Resistência!

O fiel capitão propõe uma imersão em local afastado
e silencioso. E nos leva para a Aldeia de Arcozelo.
Lá, sob o olhar do sátiro Paschoal Carlos Magno,
eles aprendem canto,
pelas mãos de Guilherme, nosso homem
do piano...
...que também embarcou, com Frida e
Daniel.
Apoio luxuoso ao processo.
Trabalha...trabalha...

E trabalha...
E ama...e se diverte...

Nos alojamentos, o quarto 12 faz história...
Com o tempo, os alunos se tornam amigos.
Amigos de dar saudade e vontade de sair
junto.
E assim é!
A comemoração inesquecível do meu
aniversário, na casa de Maurício.
Meus heróis mais queridos e seu fiel capitão.
Toda liberdade e amor, no meio do Rio de
Janeiro, no fervilhar pulsante e nervoso
do bairro da Penha.
E a gente não tem só comida! A gente
tem saída, diversão e arte!
A gente é inteiro e não pela metade.
Inteiros!
Libertos!
Cafonérrimos!

E íntimos na medida exata do bom trabalho.
O tempo passa e rola ensaio...ensaio...
Problemas com passaportes...cansaço...
burocracias infinitas...
A galera resiste!
O diretor persiste!
Ensaios na vila Cruzeiro e no teatro Ziembinsky.
Filmagem na igreja da Penha...filmagem nas ruas da
Vila Cruzeiro com o casal de mestre
sala e porta bandeira, Maria Helena e Chiquinho.
Filmagem no teatro municipal...
E no meio de uma produção urgente e cheia
de fatos inesperados,
eles completam 9 meses de trabalho intenso.
Chega o dia do ensaio geral.
E eu assisto, comovida, uns moleques (que
conheci cheios de insegurança e vontade)
descortinarem um espetáculo brilhante.
Vejo meus figurinos bailando em expressões
e movimentos dramáticos e uma direção primorosa.
E é ali que os vejo pela úlima vez, de
pertinho.
Muita expectativa nos olhares e minha alma
pregada nesse "cais" de concreto.
E recebo notícias visuais de tempos
em tempos. E os vejo felizes, no alto!
Chegam no Festival Mundial
e começam a percorrer a Holanda.
Enfrentam o frio e o próprio deslumbramento
da conquista.Enfrentam seus ânimos e
desânimos, suas diferenças...
Os preparativos de estréia.
Os teatros maravilhosos daquele país.
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Senhoras e senhores, bem vindos ao
Favela-força!

O atabaque de Jorge Neguinho

O maculelê de Romildo e Diogo
O comovente "cisne negro"
do menino Carlinhos

O expressionismo do elenco, afiado
contra o preconceito

As tres Iabás

O malandro sambando
para a morte

A loteria da morte
O espetáculo segue em
temporada pela Holanda
e é aplaudido durante dez minutos,
por uma platéia de mais de mil pagantes!

Eu estou falando de Maurício, Igor, Mayra,
Diogo, Renata, Thiago, Ana lúcia, Eliel,
Romildo, Jorge Neguinho, Gralter, Ítalo,
Cristiane, Ronie, Carlinhos.
E, por que não, Paulo Roberto, Nayara,
Andressa, Jota Bruno e Maurinho?


E eles estão lá. Passando por muitas coisas boas
e momentos difíceis também.

Assim mesmo... como a vida tem que ser.
Porém, no palco o jogo é preciso.
E qualquer coisa, boa ou ruim, tem seu preço justo.
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Estamos falando do espetáculo "FAVELA-FORÇA"
realizado com os atores da Vila Cruzeiro, no Rio de Janeiro.
sob a direção de Fabiano de Freitas.