terça-feira, 4 de março de 2008

Vá ao teatro?


Um dia, ouvi de um estudante de teatro: “o teatro perdeu público para as novelas“. Essa é uma questão tão antiga quanto a televisão. Ouvindo, porém, distanciei o pensamento daquela discussão caduca e me voltei para o percurso das desastrosas ações em que o teatro acabou se aprisionando. Perdendo terreno para as novidades do mundo eletrônico, buscou-se o perigoso caminho de trazer para a cena teatral o que se concluiu que agradava à maioria das pessoas.
O que se espera ver na TV? A vida cotidiana em uma trama específica, onde a relação com o telespectador esbarra no voyeurismo. Vemos tramas esticadas por meses, com um tempo semelhante ao que escorre no nosso dia a dia. A TV está certa! E não quero entrar no pantanoso terreno da qualidade, falo apenas da linguagem proposta desde a invenção do mercado das telenovelas. Esta forma de interpretação é apropriada para a TV. Não para o teatro.
Eis o tenebroso equívoco que traz para a cena teatral o distanciamento cada vez maior do seu elemento mais fundamental: a ação dramática. Passamos a ver no teatro um tipo de representação que reflete o modelo da linguagem proposta para a TV e, mais perigoso ainda, passa-se a acreditar que representar no teatro é como representar na TV. E, nós “gente de teatro”, tentamos nos redimir com a exclamação simplista: “no teatro é mais difícil porque é ao vivo”. E seguimos enganados, comparando duas linguagens distintas.
Na linguagem do teatro, onde o tempo é mais concentrado, precisamos nos debruçar sobre o que é essencial, desprezando tudo o que não contribui para a ação dramática. Cada elemento de um espetáculo, cada gesto, pausa, objeto, ação de luz ou música deverá contribuir de maneira objetiva e ao mesmo tempo poética para a revelação do drama. O ator realiza as ações que formam o caráter do personagem que vive o drama revelado neste espaço condensado de tempo. As ações que o ator realiza em cena, cada uma delas, têm de conter o drama. Não se pode desperdiçar as ações deixando-as car

entes de significância. Quando se constrói um espetáculo teatral com maneirismos de televisão, joga-se fora a regra mais fundamental do teatro e surge uma terceira coisa que não é mais teatro, nem é televisão. Uma tentativa desesperada de um vendedor querendo ganhar um mercado que não é seu.
Teatro não é um comércio. Teatro é encontro. Quando vou ao teatro, quero ver teatro.


(Artigo publicado pela revista Tablado ,de Brasília)

3 comentários:

Mayra Kinte disse...

Adorei, flor!

Joice Marino disse...

Que bom querida.
E eu adorei ainda mais, já que postei e não divulguei a ninguém.
Você me surpreendeu. =)
Beijos.

Mayra Kinte disse...

Eu estou sempre por aqui...