
Considerando essa preferência por ser "invisível", por que diabos quis eu ser logo ator, alguém que, justamente, tem de se revelar em público? Perguntei-me isso durante muitos anos e só agora, pouco a pouco, estou conseguindo entender o porquê. Interpretar, para mim, não é algo que está ligado a me exibir ou exibir minha técnica. Em vez disso, é revelar, através da atuação, "algo mais", alguma coisa que o público não encontra na vida cotidiana. O ator não demonstra isso. Não é visivelmente físico mas, através do comprometimento da imaginação do espectador, "algo mais" irá surgir na sua mente. Para que isso ocorra, o público não deve ter a mínima percepção do que o ator estiver fazendo. Os espectadores têm de esquecer o ator. O ator deve desaparecer.
No teatro kabuki, há um gesto que indica "olhar a lua" quando o ator aponta o dedo indicador para o céu. Certa vez, um ator, que era muito talentoso, interpretou tal gesto com graça e elegância. O público pensou: "Oh, ele fez um belo movimento!" Apreciam a beleza de sua interpretação e a exibição de seu virtuosismo técnico. Um outro ator fez o mesmo gesto; apontou para a lua. O público não percebeu se ele tinha ou não realizado um movimento elegante; simplesmente viu a lua.
Eu prefiro este tipo de ator: o que mostra a lua ao público. O ator capaz de se tornar invisível. Os atores devem trabalhar duro para se desenvolverem fisicamente, não com a simples finalidade de adquirir habilidades que possam ser exibidas ao público, mas com a finalidade de serem capazes de sumir.
Havia um famoso ator de kabuki, que morreu há cerca de 50 anos, que dizia: "Posso ensinar-lhe o padrão gestual que indica 'olhar para a lua'. Posso ensinar-lhe como fazer o movimento da ponta do dedo que mostra a lua no céu. Mas da ponta do seu dedo até a lua, a responsabilidade é inteiramente sua."
(do livro "O Ator Invisível" de Yoshi Oida - na foto, Kazuo Ohno)